29.10.14

termo

a ternura é um barco que apodrece sem uso junto a uma casa
abandonada numa planície; ridículo sem mar nem água por perto
só a humidade do ar destruindo a madeira e os miúdos correndo
no meio dos escombros, partindo unhas, imaginando oceanos
imensos nos campos de feno, um mar amarelo, muito mijo
ardendo pelos olhos fora. a ternura é uma flor teimosa que
insiste na música da madeira a decompor-se do barco, é um
medicamento contra infecções urinárias a rir-se na cara da
medicina ocidental.
a ternura é as mãos dos poetas velhos a levar cálices de aguardente
à boca, a falar de barcos onde não era suposto que houvessem
barcos, a lembrarem-se de homens e de mulheres que foram
como objectos e decidiram um dia levar as suas metáforas para
outro país menos complicado.

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